sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

Quadros em questão

Muitos falam nos quadrinhos (mas também nas infografias) como uma relação entre texto verbal e imagem. Não vou aqui entrar no mérito dessa (polêmica) discussão, pois tanto existem HQs sem textos verbais quanto HQs sem imagens icônicas (como pode ser visto na obra de François Ayroles, Feinte Trinité. Ora, se podem existir HQs sem texto verbal ou sem imagem, é porque existe um outro algo que as caracterize. O quadro, por exemplo.

É justamente dele que trata a instigante obra O Quadro nos Quadrinhos, de Fabio Luiz Carneiro Mourilhe Silva, que particularmente me agrada já a partir de sua capa. Sua pesquisa (fartamente ilustrada) procura mostrar o surgimento e o desenvolvimento do quadro como um recurso significante nas HQs. Para tal, mostra que o quadro é anterior às próprias HQs, pois já existia algo similar na pintura, que é a moldura. Ao mesmo tempo, o autor resgata alguns antecedentes das narrativas sequenciais como, por exemplo, na arte medieval.

Outro aspecto discutido por Fabio Luiz são os formatos dos quadros e de suas bordas. Ele discute as diferenças estéticas que decorrem do uso de quadros regulares ou irregulares, bem como analisa formas alternativas (quadros ortogonais, circulares, inclinados). Obviamente, entre seus exemplos ilustrados, comparecem de Winsor McCay a Chris Ware.

A leitura de O Quadro nos Quadrinhos vai revelando outras facetas, como o potencial narrativo dos quadros (recuperando aqui o importante conceito de bloco significacional proposto por Moacy Cirne em 1972); o aspecto gestáltico na percepção de um quadro ou página; e, enfim, uma boa discussão sobre a discussão dos quadros na página, no capítulo intitulado “Técnicas de Montagem”. E esse capítulo, ao que parece, dá margem para uma outra pesquisa: a página nos quadrinhos. Eu até poderia falar mais sobre a obra, mas isso seria estragar boa parte do prazer de sua leitura.

Em suma: O Quadro nos Quadrinhos consegue a proeza de unir teoria e prática, o que é um feito raro em algumas obras. Afinal, Fabio Luiz não só analisa como mostra o que está analisando. Assim, agrada tanto aos pesquisadores da área da Linguagem e da Imagem quanto aos quadrinistas e desenhistas, que necessitam ir além da concepção de que HQs são apenas textos verbais e imagens desenhadas. Ou seja: é uma leitura obrigatória para quem pretende conhecer melhor os quadrinhos e seus quadros.

O Quadro nos Quadrinhos.

Fabio Luiz Carneiro Mourilhe Silva

Rio de Janeiro, Multifoco, 2010, 292 páginas

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