sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

Os quadrinhos como uma forma visual de discurso

É muito bom ler livros sobre quadrinhos. Se eles têm algo a ensinar sobre a Nona Arte, melhor ainda. E se, além disso tudo, eles ensinam e mostram aquilo sobre o que estão falando, então o livro se torna obrigatório.

É o que ocorre com o livro El Discurso del Comic, de Luis Gasca e Roman Gubern. Os autores espanhóis tratam de discutir com bastante propriedade um aspecto central dos quadrinhos: o fato de que eles (assim como o cinema) também mostram algo, e não somente narram. Aqui, os autores partem das definições do francês Gérard Genette sobre as diferenças entre narrar e mostrar.

A partir dessa premissa, os autores fazem um levantamento de cerca de 2 mil quadros (!) ao longo de mais de 700 (!) páginas. Esse levantamento ajuda a ilustrar, para o leitor, as diferentes convenções semióticas envolvidas no ato de criar e desenhar uma história em quadrinhos.

Um exemplo bastante simples disso: toda HQ (assim como as imagens cinematográficas) necessita de um tipo de enquadramento. O enquadramento nada mais é (nos termos aqui propostos, ressalte-se) do que uma forma de mostrar, e não de narrar. Primeiros planos, planos gerais, detalhes, closes e outras formas de enquadramento pertencem a um universo visual.

A leitura do livro vai deixando cada vez mais claro que os quadrinhos não podem ser analisados (apenas) à luz das teorias literárias que digam respeito unicamente ao texto verbal. Os estereótipos sociais (bêbado, anjo, herói, vilão) dependem das características visuais que facilitem a identificação de cada personagem na narrativa quadrinística. O mesmo vale para os estereótipos visuais (jogar água, estar ferido, estar aterrorizado).

Assim, temos uma obra que fala sobre gestos (mãos, pés, rostos), situações arquetípicas (perigo, queda, fome, sede, transpiração), símbolos cinéticos (quedas, golpes, enjoo, tédio), formas de balões (falas, pensamentos, alucinações), letreiramentos... enfim, tudo aquilo que, seja ele um desenhista ou um roteirista de quadrinhos, deve conhecer. Ou seja: temos aqui uma verdadeira enciclopédia da gramática visual dos quadrinhos.

Sem abrir mão de um certo referencial linguístico, El Discurso del Comic se torna também uma leitura obrigatória para quem pretende conhecer um pouco melhor o universo visual dos quadrinhos e as suas convenções.

Luis Gasca e Roman Gubern

El Discurso del Comic

Madri, Cátedra, 2001, 714 páginas

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