quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

Garçom, um guardanapo!

Existem alguns livros que podem tornar sua vida menos tediosa. Mas poucos podem também, e ao mesmo tempo, ser profissionalmente úteis. Estou falando do livro The Back of Napkin, do consultor norte-americano Dan Roam. A edição que tenho e que aqui comento é a colombiana, intitulada La Clave es la Servilleta, mas a obra já tem uma edição brasileira, da editora Campus, que se chama Desenhando Negócios (pena que a tradução se afaste um pouco do espírito original da obra).

A proposta de Roam é simples: ele pretende ensinar técnicas de como se comunicar – e vender ideias – a partir de desenhos bastante simples, mas eficientes. A premissa é simples: nem sempre é possível se comunicar com uma pessoa que domina apenas o russo, o chinês mandarim ou qualquer outro idioma pouco usual; mas, com um pouco de técnica rudimentar de desenhos, é possível expressar suas ideias – e até fazer negócios, segundo ele.

Os nomes da obra no original em inglês e na tradução em espanhol remetem diretamente à sua ideia central: a de que os esboços, como aqueles feitos em guardanapo (numa mesa de bar cercado de amigos, acrescentamos nós), podem ser uma poderosa ferramenta de transmissão de informação.

Dan Roam desenvolve algumas considerações sobre o pensamento visual, para ele composto de quatro etapas: olhar, ver, imaginar e mostrar. Ou seja: olhamos à nossa volta, vemos as coisas, imaginamos algo sobre elas e mostramos a nossa decisão em relação a ela. É a partir desse pressuposto que o autor trabalha.

A questão que mais nos interessa aqui diz respeito às técnicas de mostrar algo que é resultado de nossa percepção, leitura e imaginação, visando a uma tomada de decisão – devemos ter em mente que o livro de Roam se destina à área de administração, mas é bastante útil ao que nos interessa aqui. O autor expõe diferentes modos de mostrar algo – e nisso ele se aproxima, como veremos, e talvez sem se dar conta, da chreia da Retórica antiga, que solicitava aos retores o desenvolvimento de temas a partir de perguntas como “quem?”, “o quê?”, “como?” e assim por diante. Perceba-se que a chreia também está na base do conceito do lide jornalístico. A diferença, aqui, é que esses elementos devem ser compreendidos visando a visualização de alguma coisa.

Roam lista os diferentes modos de mostrar conforme a questão a ser respondida visualmente – e, desde já, desculpem se o período será longo, ainda que necessário. Se o que queremos mostrar é como algo ou alguém é (uma representação qualitativa), devemos usar retratos (desenhos ou fotos); se queremos mostrar o quanto de algo (uma representação quantitativa), apelamos para gráficos estatísticos; se o foco é o “onde” (a posição de algo no espaço), precisamos usar um mapa; se a questão é o “quando” (a posição de algo no tempo), desenhamos um cronograma; se o que interessa é o “como” (uma relação entre causa e efeito), a solução é um diagrama de fluxo; e, finalmente, se o foco central é o “por que” (a relação entre dedução e predição), precisamos fazer uma matriz de variáveis múltiplas.

Para os jornalistas, as maneiras de ver e mostrar de Roam são utilíssimas, uma vez que correspondem aos vários recursos gráfico-visuais que encontramos nos jornais, revistas e portais. Talvez a mais rara seja a matriz de múltiplas variáveis, que pede uma boa dose de alfabetização gráfica por parte do leitor, para compreender o que está proposto nesse tipo de gráfico, ou seja, as diferentes relações entre ao menos três variáveis.

Aqui, lembro-me, por exemplo, do excelente gráfico feito por Alberto Cairo no começo de 2011 (quando de sua estada na revista Época) sobre a desigualdade no Brasil e que usava diversas variáveis (coeficiente de desigualdade GINI e qualidade da distribuição de renda, avanço do PIB brasileiro, governo presidencial de cada período, linha do tempo). Cairo desenvolveu outros gráficos similares, sempre com eficácia informativa e qualidade estética.

Mas o mais bacana do livro de Dan Roam é instigar o leitor a se convencer de que qualquer um pode transmitir informações visualmente – bastando, para tanto, que se saiba desenhar formas geométricas básicas, linhas, setas e bonecos de palito – ah, ele ensina até a forma correta de se desenhar um boneco de palito!

Em suma: um livro útil para quem pretende se iniciar seja na infografia (como já dissemos), seja nos quadrinhos – que, em tese, são diagramas de fluxo que mostram como algo se desenvolve (no caso, uma história narrativa). E lembre-se: um guardanapo ainda pode salvar a sua vida...

Dan Roam

La Clave es la Servilleta – resolver problemas y vender ideas mediante dibujos

Norma, Bogotá, 2009, 302 páginas

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